Da Força das Circunstâncias

Lá estava: sentada, torta para a lateral, antebraço no braço do sofá, ais mudos. Doçura da casa envelhecida, aquecida pelo calor do fogão a lenha, conforto adensado pela bruega que cai miúda para lá da janela  estanque de alumínio.
A avó à minha espera.

Conversa que puxa conversa, lá pescou à linha o tema das dores. Que a primeira dor de ossos a tinha sentido aos trinta e sete anos, andava a trabalhar a terra, ficou curvada como uma velha de oitenta, dizia-me agora, aos oitenta e dois, sem caminhar vergada. Com dores, sim, nos joelhos - maleita de família-, mas não marreca da espinha.

E um bom amigo meu, vinte e poucos, faz um movimento e fica encravado, com o tronco a uns cento e vinte graus em relação ás pernas. Ali ficou, especado como uma vara por onde trepam feijões, mas em arco gótico, imóvel e indefeso como nem algumas pessoas de oitenta e dois que conheço.
Que lhe trouxessem pasta e escova de dentes, não queria ser atendido no hospital com hálito a digestão feita há umas horas. O problema foi levar a água do copo à boca sem lhe escorregar pelos beiços.
Lá foi. Ciática.

A força das ideias e expressões não é maior que a força das circunstâncias. Excepto quando coincidem.

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